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Cinema

[Crítica] Vai que dá certo – Bom até quando é ruim

Eis que Vai Que Dá Certo (de Mauricio Farias – diretor e roteiro original) ultrapassou o número de um milhão de espectadores em dez dias. A marca de 100 mil espectadores no Brasil, diariamente, deixa evidente que o filme é um grande sucesso de público e bilheteria. Enquanto isso, toda e qualquer crítica do filme pisa em ovos na hora de falar alguma coisa: alguns ressaltam a “nova geração de comediantes”; outros revelam a diferença entre tipos de atuação de uns para outros. Também há àqueles que desviam do assunto e resolvem falar de gêneros – “o filme realista tem aspectos de comédia pastelão à lá Chanchadas.” Outros ainda, assumem uma posição intermediária e, aproveitam o filme para falar do canal de internet Porta dos Fundos, mas o que nenhum tem a coragem de dizer é: o filme é divertido.

Já se foi o tempo em que se era obrigado a rechaçar uma obra por conta de seu conteúdo de mero entretenimento, cujo objetivo final é simplesmente fazer com que consumidores paguem por momentos de diversão. Passamos dessa fase de culpa por se divertir, culpa por dar certo, culpa por estarmos bem. Essa coisa de ter inveja de pobre, típica da zona sul carioca, está sendo passada por cima por uma nova geração engraçada, debochada, politicamente incorreta e que, aos atropelos, vai fazendo humor e renovando esteticamente a forma de pensar e rir do brasileiro. Vai Que Dá Certo ruma nesse sentido e, nesse ponto, acerta em cheio.

O filme conta a história de três amigos (Fábio Porchat, Gregório Duvivier e Felipe Abib) que são convencidos por dois rapazes (Danton Mello e Lúcio Mauro Filho) a entrar em um roubo de carro forte para levantar uma grana e melhorar a vida de todos. Enrolados e atrapalhados, eles pioram a situação e acabam devendo um montante ainda maior: uma parte para bandidos, outro para a polícia. É aí que resolvem contatar um conhecido (Bruno Mazzeo), que como é candidato às próximas eleições, poderia ajuda-los.

Vai Que Dá Certo se usa de fórmulas convencionais de cinema, misturas que advém da cultura pop americana desde os filmes de ação, roubo e assalto, até as comédias de erro e peripécias em que um pequeno ato fora do padrão acaba por culminar numa outra série de desarranjos que desfazem uma estrutura que precisa ser refeita. O mais interessante é o humor ligeiro, muitas vezes físico, de atores que se tropeçam e se sobrepõe a fim de atingir uma ação que, no coletivo, se torna patética e impossível. A risada, nesses casos, é certa.

É evidente que o filme tem erros. Por se tratar de uma comédia ligeira, alguns detalhes importantes escapam: os mal treinados sotaques de paulista que, caricatos, ao mesmo tempo em que geram risos, dão um tom canastrão ao filme; a constante troca de forma de condução narrativa, às vezes focada na personagem de Danton, às vezes retirando-se para a observação caótica e, em alguns casos, se perdendo na confusão que o próprio filme propõe. No entanto, não se pode derrubar um sucesso apontando erros e o principal deles, aquele que desqualificaria o filme passa longe da produção: a tentativa de acertar, de ser correto, de parecer inteligente.

Vai Que Dá Certo, por se propor a fazer exatamente o que faz, sem transpor qualquer outro tipo de entendimento pelas entrelinhas ou buscar um pano de fundo político ou crítico, ou seja, por incorporar uma espécie de lógica nonsense, politicamente incorreta e irônica, acaba por ter a potência de apontar problemas de nossa sociedade como meninos pobres que vendem bala nos sinais de trânsito, políticos que fazem caixa dois, sequestros, mulheres atrás de homens com dinheiro, etc.

O mais importante em Vai Que Dá Certo é perceber como o cinema brasileiro tem fôlego e se renova para um público que até então tinha preconceito. Creio que quando um povo se distancia de um tipo de arte, é porque aquela arte deixou de representar esse povo. Assim sendo, Vai Que Dá Certo dá conta do recado e abre portas para novos filmes e novos públicos dentro da sétima arte nacional. Se o filme não é perfeito e se não é uma obra-prima, também não se prestou a tal e, por conta disso é que é tão relevante. É porque o humor, como qualquer pensamento, precisa dar conta de todas as frestas e arestas para ser verdadeiro, sincero e eficaz.

“Vai que dá certo” está em cartaz no Top Cine Hipershopping ABC com sessões às 17:10h / 19:10h / 21:10h. A classificação é 12 anos.

Luiz Antonio Ribeiro é dramaturgo e poeta, formado em Teoria do Teatro pela UNIRIO – Univesidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, onde atualmente cursa Letras – Português/Literaturas.

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