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“Estes são os melhores dias de nossas vidas”, diz vocalista da Hover

Mais do que coragem, para fazer Rock no Brasil é preciso um enorme talento, além da capacidade de sempre dar novos significados ao mundo como ele se coloca. A atitude do roqueiro não pode nunca se deixar levar pela onda do óbvio ou do já pré-estabelecido, como tenta fazer o culturalismo provinciano que, às vezes, toma conta do brasileiro.

Os rapazes da banda Hover  ultrapassam essa barreira com simpatia, bom humor, presença de palco e uma sinceridade musical, fazendo aquilo que mais querem, ou melhor, aquilo não podem e não conseguem deixar de fazer. Essa é fórmula encontrada por esses rapazes para fazer música, e  enfrentar uma geração que parece anestesiada pela publicidade e pelas regras sociais.

Como diz Saulo Von Seehausen, vocalista e letrista da banda, o rock nacional que a banda faz tem espírito escocês, e o rock escocês deles é também nacional. É um e outro ao mesmo tempo e é isso que desespera as cabeças pensantes que tentam limitar as possibilidades do grupo. Afinal de contas, a música é para isso: ver, pensar e viver.

Se antes eles eram Mauricio Lago e usavam camisa social e gravata para compor o visual do grupo, agora na Hover o estilo é “toque com o que veio de casa” ou algo parecido. O vocalista e letrista da banda, Saulo Von Seehausen, conversou com o Acontece em Petrópolis, às vésperas do show da banda no Solstício do Som , que acontece às 22h, no próximo sábado (15), em Petrópolis.

AeP: O rock sempre foi visto com um pé atrás por todos: pelos pais, pelos vizinhos e pela sociedade em geral. No Brasil da MPB, que parece ainda ter uma grande resistência à guitarra elétrica, que se mistura com uma tendência em nossa cidade de não gostar de nada que ultrapasse alguns decibéis, isso fica mais latente. Como é a opção por fazer rock nesse contexto e principalmente a escolha de compor em inglês?

Saulo:  É uma escolha complicada. Mas quem se propõe a fazer arte sabe que não existe bem uma escolha. Aquilo é sua verdade, é produto da sua experiência, uma soma de influências e gostos. É até meio filosófico isso! Será que podemos dizer que escolhemos os nossos gostos? São coisas muito subliminares, eu acho. A questão da língua, inclusive. Fomos criados ouvindo praticamente tudo de música em inglês. Somando isso ao fato da sonoridade melhor para o rock, a coisa é meio que natural. Não penso “vou compor em inglês”. É o natural pra mim. Talvez seja difícil para as outras pessoas de entender essa questão, porque temos a tendência de não entender o que não é natural pra gente, né? Bom, posso dizer que entendo isso. (risos)

Voltando ao assunto de fazer rock, o que é mais curioso é que o rock feito no Brasil ganhou um rótulo que acabou gerando um outro “estilo” de música: o Rock Nacional. E aí fica complicado, porque desse tipo de música, eu tenho certeza que não gosto. Mas somos uma banda fazendo rock no Brasil… Como fica? Já até me acostumei com a pergunta “Por que vocês não fazem Rock Nacional?”. Isso costumava me irritar muito! Respondia “Pelo mesmo motivo que não faço Axé”. Mas a postura vai mudando conforme a gente amadurece e ganha mais segurança em relação a nossas “escolhas”.

AeP: Por diversos motivos ditos acima, parece que uma saída que a Hover encontrou, enquanto banda, é uma postura frente ao mundo de muito bom humor. A maneira como se olha as coisas, se encara e se devolve em ironias, atribuições errôneas, brincadeiras, parece ser a forma ideal de se posicionar frente a essa estrutura sem precisar necessariamente bater de frente com ela. É isso ou é algo mais?

Saulo: É exatamente isso que a gente aprendeu com o amadurecimento. Falo mais por mim, que sou o letrista da banda, mas a gente conversa bastante sobre isso. Aliás, a gente conversa bastante sobre a banda. Acho que isso influencia também nessa postura meio despojada, porque a gente desgasta tanto esses assuntos que acaba ficando engraçado. Era muito divertido inventar os motivos pelos quais o nome era Mauricio Lago. E hoje em dia, é divertido responder por que nós não fazemos Rock Nacional. A resposta pode ser desde “mas nós fazemos!” até “porque o espírito que se manifesta através de mim é escocês”.

AeP: Falando de música especificamente, a primeira vez que ouvi a Maurício Lago foi naquele saudoso conjugado 509 (apartamento no Flamengo onde eu morava e moro até hoje) entre algumas cervejas. Você não contou que era um projeto seu para tentar colher informações que não eram viciadas pela nossa amizade. Lembro que ficamos elogiando e tentando aproximar referências. Quando foi que você percebeu que aquela composição fazia parte de um projeto que poderia crescer, virar banda e dar os frutos que vem dando?

Saulo: Engraçado isso, né? Eu nem lembrava que fazia isso. Gostava de mostrar pros amigos sem falar que era eu pra ter uma opinião sincera, como você disse. Foi assim que começou a dar certo, na verdade. Isso começou a me dar mais segurança e vontade pra ir à frente com a ideia. E o fato de “imaginar” que era outra pessoa deixava a responsabilidade mais longe. Quando decidimos fazer o Mauricio Lago virar uma banda, as coisas mudaram bastante! Mas foi um passo importante.

AeP: Parece-me que fazer música nos últimos vestígios de adolescência é algo que não é simples. As mudanças tanto internas quanto externas chegam ao limite máximo como definir uma carreira, precisar de dinheiro, estabelecer relacionamentos, entre outras coisas. A mudança do nome de Mauricio Lago para Hover tem a ver com essa nova maturidade, esse novo momento em que vocês percebem que o estilo da banda já é outro, assim como vocês, e é preciso de novo formato que comporte esses novos sujeitos?

Saulo: Totalmente. Acho que essa foi, principalmente, uma transição de um projeto que começou voz e violão (e se tornou uma banda) para um trabalho bem mais coletivo. A gente passou por muitas coisas no meio do caminho. Tudo isso que você citou! Namoro, término de namoro, emprego, mudança de emprego, entrega de monografia, aperto de grana, pressão em casa, chegar mais perto dos 30…Isso fez um bem danado pra gente. Principalmente como amigos. Ficamos cada vez mais próximos!

Mas eu estaria mentindo se dissesse que só fez bem. Passamos por uma fase muito difícil, porque ao mesmo tempo em que paramos de fazer os shows cheios de covers que fazíamos antes nas boates em Petrópolis e tentamos nos inserir no Rio com um som próprio, estávamos nos encontrando como banda. Foi uma mudança turbulenta. Do jeito que é sair da adolescência, né? Mas a música ajudou muito nesse processo. Foi fundamental, principalmente para nos manter unidos.

AeP: Para finalizar, como vocês veem a iniciativa do Solstício? E o que o público de Petrópolis pode esperar do show de vocês nesse evento?

Saulo: Ao meu ver, a iniciativa do Grupo Solstício de criar o evento Solstício do Som ultrapassa a ideia de apenas se realizar um festival. O que estamos presenciando (e, no nosso caso, muito honrados, participando) é uma mudança incrível que está acontecendo na cena cultural de Petrópolis. Uma mudança de panorama, de pensamento e comportamento. Quem vai ao Solstício como espectador talvez não perceba tanto isso. Para nós, que, apesar de ainda jovens na cena petropolitana, vivenciamos também um tempo em que não se conseguia realizar nada, está sendo incrível. Antes, salvo raras exceções, para conseguir fazer muitos shows, o trabalho não podia ser totalmente autoral. Se o trabalho era autoral, além da dificuldade natural, considerar-se um artista era descabido. Quem via sua arte? Salvo raras exceções, novamente.

Agora, com o Solstício, eu vejo a cidade cheia de artistas, na melhor concepção da palavra. A gente vê as bandas se movimentando, querendo produzir, evoluir, se dedicar. Isso é uma cena acontecendo! Se todas as bandas estão produzindo coisas boas ou não, se vão fazer sucesso ou não, se vão sair daqui ou não é um detalhe que não é importante agora. Estão produzindo, e isso tem o valor necessário pra esse momento. Os frutos virão!

Sobre o nosso show, posso garantir que será o melhor que a gente já fez. A energia do festival já está incrível… E ela parece se acumular a cada edição! Vamos tocar uma composição nova que é particularmente muito importante e especial para nós. É uma homenagem ao nosso amigo e entusiasta do Solstício, o fotógrafo Michael Lennertz, que perdemos recentemente. Tocaremos pela primeira vez a música, e não poderíamos estreá-la de maneira melhor.

Bom, a batalha ainda é suada (e já é, por si só), mas agora sinto que todos temos uma base. Um chão firme pra pisar. Isso é lindo de se ver, pensar e viver. Estes são os melhores dias de nossas vidas.

A banda é formada por:

Saulo Von Seehausen– Voz, guitarra e violão

Lucas Von Seehausen – Voz e guitarra

Pedro Fernandes – Baixo e Voz

Felipe Duriez – Guitarra e Voz

Bruno Leonardo – Bateria

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