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Cinema

Crítica: Divergente (2014)

O futuro é aqui. Ele não bate na porta porque ele não vem, ele é. Tudo que olhamos é o futuro, uma vez que o que vemos não é o mundo, mas aquilo que o olho lança no mundo. Eis porque é tão importante a função de enxergar, ver e olhar, na hierarquia proposta por Saramago. Acontece que, com nosso olhar viciado pela sequência eterna de imagens de nosso mundo, não conseguimos vislumbrar um ambiente que não seja igual ao presente e, quando conseguimos, é o mais terrível possível – devastador e apocalíptico. O cinema e a literatura muito tem explorado isso. Divergente é apenas mais um caso: e um excelente caso.

Divergente (2014), de Niel Burger, baseado no romance homônimo de Veronica Roth, conta a história de uma Chicago do futuro, dividida por cinco grupos de castas, chamadas de facções: Abnegação, Amizade, Audácia, Erudição e Franqueza. A jovem Beatrice, nascida na Abnegação, é levada para sua escolha da sua facção para o resto da vida, mas nos testes se descobre que ela é uma Divergente (ou seja, se encaixa em mais de uma facção). A partir daí, ela passa a precisar esconder seu segredo, ao mesmo tempo em que se prepara para um golpe de estado que vem sendo tramado.

O que mais me deixou satisfeito no filme foi o modo justo e medido com que a adaptação do roteiro e a transcrição dos episódios do livro para o cinema foram feitas. É possível perceber a todo momento que o espetáculo não quer se sobrepor à narrativa, nem a narrativa quer se sobrepor às ideias, ou seja, não há uma hipervalorização de coisas óbvias e comuns como relações familiares, nem clichês dramáticos de histórias de amor, nem cenas de ação excessivas. No entanto, há tudo isso, só que em uma justa medida!

Divergente me faz pensar que essas facções, ou castas, como eu prefiro chamar, já existem em nosso mundo onde é cada vez mais difícil fugir de si mesmo, ou seja, há um projeto de hipervalorização do eu com a pergunta: “quem eu sou?”, e as respostas: “preciso ser quem sou”, “preciso me valorizar”, que constroem sujeitos incapazes de dar a volta sobre eles próprios e mudar. Os Divergentes nada mais são que nossos rebeldes de hoje: seres caros, raros e incontroláveis, queridos, afetivos, mas ariscos e, por isso, um risco para todo o sistema tradicional estabelecido.

Trata-se de um filme de lugares simples, mas simplórios, de jogos de possibilidades múltiplos e isso tudo sem deixar de ser popular e palpável para os adolescentes em formação. Divergente é uma grata surpresa. Assistam!

O filme continua em cartaz no Cinemaxx Mercado Estação, com sessão dublada, às 20h30; e no Cine Bauhaus, com sessões legendadas às 17h e 20h.

 

luizLuiz Antonio Ribeiro 28 anos, dramaturgo, letrista, crítico e flamenguista. É bacharel em Teoria do Teatro pela UNIRIO, mestrando em Memória Social na área de poesia brasileira e graduando do curso de Letras/Literaturas. É adepto da leitura, pesquisa, cinema, cerveja e ócio criativo. Desde 2011 é membro do grupo Teatro Voador Não Identificado. Facebook: http://www.facebook.com/ziul.ribeiro Twitter: http://www.twitter.com/ziul

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