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[Coluna] Resistência à Ditadura Militar em Petrópolis: o movimento estudantil em 1968

por Eduardo Stotz, presidente da CMV

Ontem pela manhã as ruas centrais de Petrópolis ficaram repletas de estudantes em passeata, em sinal de protesto contra a violência policial que matou o jovem Edson Luiz de Lima Souto. Os estudantes de Petrópolis estavam de luto. (Diário de Petrópolis de 30/03/1968) Mais tarde, reunidos em sua Universidade [Católica de Petrópolis], os acadêmicos de Direito, de Engenharia e de Filosofia decidiram entrar em luto oficial por 3 dias, suspendendo as aulas até a próxima segunda-feira (Jornal de Petrópolis, 30/03/1968), conforme nota do Diretório Central dos Estudantes, assinada pelo seu presidente, Julio Cesar Menescal, publicada no Diário de Petrópolis na mesma data.

Outra passeata é marcada para as 18 horas. O delegado Péricles Gonçalves, chefe da 11ª Região Policial foi ao encontro dos organizadores para ponderar a inoportunidade da passeata, mesmo porque não estava devidamente autorizada. (Diário, 30/03/68) Os estudantes, contudo, realizam, sob a chuva, uma passeata unificada, silenciosa e de luto, com cartazes protestando contra a violência e a ditadura. Dirigem-se à Câmara Municipal e em seguida ao gabinete do prefeito Paulo Gratacós, superlotando a sala e demais dependências. A pedido dos estudantes o prefeito decreta luto oficial por três dias na cidade (Diário, 30/03/68). O assassinato de Edson Luis acontece no meio da repressão a uma passeata-relâmpago contra a alta do preço e a má qualidade da comida no restaurante do Calabouço.

Imagem: estudante secundarista Edson Luiz: morto pelos militares, que invadiram um restaurante [Calabouço] no RJ disponibilizada no site https://image.slidesharecdn.com/histria20otropicalismo-090702213435-phpapp01/95/o-tropicalismo-12-638.jpg?cb=1451852673

Uma nota do delegado Gonçalves publicada na imprensa refere-se aos estudantes como uma classe ordeira e compreensiva, na expectativa de colaborar mais uma vez com o seu aparelho policial, pois é público e notório que este mesmo aparelho, consoantes ordens expressas do exmo Sr. Cel. Francisco Homem de Carvalho, honrado Secretário de Segurança Pública, deve ser apenas acionado contra os inimigos do povo, os fora da lei e os marginais que insistem em prejudicar a comunidade (Diário, 30/03/68)

Ordeira tem sido, até então, a Associação petropolitana de Estudantes (APE), mobilizada apenas por festas e eventos sociais, apesar da organização, desde 1966, de alguns grêmios sob uma liderança mais combativa como no Colégio Princesa Isabel. Os estudantes universitários, ao contrário, já lutam por melhores condições de estudo, a exemplo do restaurante universitário pleiteado à UCP e a renovação das matrículas por conta dos atrasos repasse das cotas do Programa Especial de Bolsas de Estudo (PEBE). O movimento estudantil expressa o sentimento generalizado de revolta das classes médias, impedidas de ascender socialmente pela política educacional e econômica do governo.

Fato é que o episódio trágico do restaurante do Calabouço precipita as manifestações massivas dos estudantes em todo o país. No dia 1º. de abril de 1968 uma passeata estudantil contra a ditadura militar na Guanabara enfrenta as tropas de choque. A missa de sétimo dia de Edson Luís, na Igreja da Candelária, é violentamente reprimida, apesar das tentativas dos padres de defender os estudantes e populares presentes. As manifestações são interpretadas pelo governo do general-presidente Costa e Silva como uma contestação à ordem. No dia 3 de abril, o Jornal de Petrópolis publica “A continuarem as agitações o Governo iria ao sítio”. As tropas do I Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em apoio à Polícia Militar, controlam as ruas do centro do Rio de Janeiro.

A agudização política dos conflitos de classe, protagonizadas pela classe média no começo de 1968 e pela classe operária nas greves de Contagem e de Osasco, em abril e em julho do mesmo ano, é interpretada como uma ameaça que precisa ser erradicada (trata-se dos “inimigos do povo”, no dizer do delegado Péricles Gonçalves). Até mesmo a oposição liderada por Carlos Lacerda sofre com a proibição de funcionamento da Frente Ampla em 5 de abril, proscrita por uma portaria do Ministério da Justiça. A queda do 30º. Congresso da UNE, em Ibiúna (SP) e a prisão de Vladimir Palmeira em outubro, entretanto, dramatizam a derrota do movimento estudantil. O controle cada vez maior da vida social é praticado pela polícia política, inclusive em Petrópolis, como se pode constatar nos pedidos feitos à Prefeitura, de encaminhar a relação dos edifícios existentes, nomes dos proprietários dos apartamentos, número total de andares e elevadores de cada edifício (Of. 23/68, de 23/04/68. Acervo da 67ª DP/Museu Imperial) e a relação dos endereços e números de alunos matriculados nas Faculdades existentes (Ofício n. 37/68- S.A., de 12/07/1968. Idem)

Tudo antecipa a decretação do Ato Institucional no. 5, de 13 de dezembro de 1968, iniciando um longo de período de “paz social” imposta pela força sistemática, uma paz de cemitério.

A Comissão é formada por: Eduardo Stotz – sociólogo e historiador, pesquisador da Fiocruz; Glauber de Oliveira Montes – historiador e professor; João Fabre dos Reis – advogado trabalhista; Maria Helena Arrochellas – teóloga e coordenadora do Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade; Rafane Valoura Paixão – historiadora e Roberto Schiffler Neto – sociólogo e professor.

Endereço e acesso: Prefeitura Municipal de Petrópolis – Avenida Koeler, 260 – Centro – Petrópolis – RJ – Tel.: (24) 2246-9325. Facebook.com/cmvpetropolis – [email protected]

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