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[Coluna] Ditadura Militar: “Milagre Econômico” e Desastre Social – parte 1

por Eduardo Stotz, presidente da CMV

Em 25 de junho de 2013, em depoimento prestado à Comissão Municipal da Verdade de São Paulo, Antonio Delfim Netto, ministro da área econômica dos governos da ditadura militar entre 1967 e 1974, afirma taxativamente não ter qualquer arrependimento de ter sido signatário do AI-5 e, se as condições fossem as mesmas, repetiria a atitude. O ministro fez ainda a defesa da manutenção da Lei da Anistia. Certamente não devemos nos surpreender com esta posição, pois a lei da anistia resguarda todos os agentes da ditadura militar, do alto comando das Forças Armadas aos civis colaboradores, inclusive ministros de Estado como ele, passando pelos militares e policiais diretamente implicados na repressão política.

Em contrapartida, causa espanto o fato de um grande número de pessoas das classes trabalhadoras, contra as quais o golpe foi desencadeado e a ditadura militar implantada, tenha uma imagem positiva desse regime, sobretudo no período acima apontado. Assim, devemos nos perguntar: por que há quem acredite ter sido uma época boa para o país?

Trata-se de reconhecer que o período é marcado por um enorme crescimento econômico, sustentado em processo de industrialização acelerada e de gigantesca urbanização, com o deslocamento de milhões de pessoas do campo para as cidades. Vale lembrar, porém, que o crescimento de 11% do Produto Interno Bruto entre 1968 e 1974, denominado na época de “milagre econômico”, implica um inaudito agravamento da exploração da força de trabalho mediante o “arrocho salarial”, acarreta uma elevação brutal dos acidentes de trabalho, com alta letalidade, das doenças de trabalho e acentuada mortalidade devido a epidemias, além de exacerbar a violência nas periferias das grandes cidades.

Façamos aqui breve análise desse processo ocorrido sob a ditadura militar.

Uma situação favorável no cenário internacional, com a disponibilidade de capitais para investimento a taxas de juros razoavelmente baixas (os chamados eurodólares), e a exportação de produtos primários permitem o crescimento da infraestrutura (rodovias, hidrelétricas), siderurgia, petroquímica, construção naval; por sua vez, esses ramos da indústria pesada propiciam os insumos para a produção de bens de consumo durável, principalmente automobilística. Acarretam também uma dívida externa gigantesca, com aumento de 32 vezes entre 1964 e 1985.

As taxas de crescimento do PIB ou de acumulação de capital estão baseadas numa violenta compressão dos salários reais dos trabalhadores, cujos reajustes, baseados em índices pré-fixados, somente são reajustados após 24 meses. Não por acaso o “arrocho salarial” pressupõe o controle da organização dos trabalhadores, favorecido pelo atrelamento dos sindicatos ao Estado vigente desde a era Vargas.

Apesar do arrocho salarial, há aumento da massa salarial; uma tendência ao pleno emprego por volta de 1973 leva as grandes empresas a conceder aumentos salariais “espontâneos”. Essa situação leva a mudança na política salarial, com os reajustes acontecendo a 12 meses e finalmente semestralmente. Por outro lado, quem vive no campo e nas cidades do interior em permanente nível de subsistência mantido, sobretudo no Nordeste, pelo domínio do latifúndio, percebe, na migração para as grandes cidades, onde há abundante oferta de emprego na construção civil, a possibilidade de uma melhora no padrão de vida.  Na medida em que a consciência social tende, na ausência de lutas, a naturalizar a ordem vigente, o nível de emprego funciona como uma compensação para a brutalidade da exploração e da violência vivenciadas. É o que será examinado na próxima matéria.

(Imagem disponível no blog Cacimba de Areia)

A Comissão é formada por: Eduardo Stotz – sociólogo e historiador, pesquisador da Fiocruz; Glauber de Oliveira Montes – historiador e professor; João Fabre dos Reis – advogado trabalhista; Maria Helena Arrochellas – teóloga e coordenadora do Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade; Rafane Valoura Paixão – historiadora e Roberto Schiffler Neto – sociólogo e professor.

Endereço e acesso: Prefeitura Municipal de Petrópolis – Avenida Koeler, 260 – Centro – Petrópolis – RJ – Tel.: (24) 2246-9325. Facebook.com/cmvpetropolis – [email protected]

Mais em:

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