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Coluna LiteráriaCultura & Lazer

[Coluna literária] “Folhas de Relva” – Walt Whitman

Quem quer que seja venha viajar comigo!
Viaje comigo e descubra o que nunca cansa.

 A terra nunca cansa,
a terra é rude, silenciosa, de início incompreensível.”
Walt Whitman

A poesia é cheia de tentáculos. De todos os lados existem diversos gurus que criam escolas desse tipo singular de palavras. Vocês já pensaram que poesia nada mais é que a organização das palavras comuns em uma forma quase etérea e metafísica? Então, esses capazes de criar esse tipo de beleza das entranhas da linguagem, se tornam mestres. Por isso, resolvemos nessa coluna literária recomendar um dos maiores poetas americanos de todos os tempos. Leiam a resenha das obras completas de Walt Whitman:

Walt Whitman é, entre os poetas, uma espécie de profeta: é desses exemplos de criadores de mundos a partir da palavra e que, por ser tão voraz em sua proposição, acaba por se desdobrar em uma série de diversos poetas que, ao escrever, tentam encontrar Whitman.

Ele está para a língua inglesa como Baudelaire ou Rimbaud estão para a língua francesa: um homem do mundo, da noite, dos excessos, um dos primeiros a pensar a vida urbana das grandes cidades que se formavam e ver nelas potências positivas, ao lado de diversos aspectos críticos que seriam as mazelas dos homens do próximo século. Paulo Leminski, ao contrário, afirmava que Whitman foi o grande homem da Revolução Americana, tal como Maiakovski para Revolução Russa. Seu compêndio de poesia é nada mais que o retrato do homem inglês do século XIX e do futuro de toda poesia marginal do século XX. Walt Whitman, como profeta, faz poesia, e como poesia, ultrapassa as palavras.

Folhas de Relva, Edição do Leito de Morte é dentre as diversas versões das poesias completas de Whitman, aquela que ele considera definitiva. A edição luxuosíssima, da Editora Hedra, reflete um cuidado absoluto em todos os aspectos, desde a diagramação, introdução, prefácio e notas, com toda atenção que o poeta merece, fazendo da coletânea, provavelmente, a mais completa e abrangente sobre o autor. Para se ter uma ideia, estou lendo esse livro, aos poucos, desde dezembro, pois achava que alguma revelação era feita nessas palavras e elas não deviam ser desperdiçadas como se faz, em geral, quando se lê apenas para consumir conteúdos.

Meu objetivo nessa resenha é tentar apontar dois caminhos para a poesia de Whitman: um que o diferencia dos demais poetas e diz aquilo que ele tem de mais singular, e outro em que percebo sua filiação com toda a poesia do desbunde contemporâneo, principalmente, com a geração beat. Começo, então, por essa parte:

O prefácio de Gambarotto destaca a ideia de que, pelo fato de os Estados Unidos estarem se formando como nação, pelo menos culturalmente havia em Whitman uma espécie de “ética”. E ética, nesse caso, que deve ser lida em dois aspectos: um social, na medida em que havia uma tentativa de obtenção de uma pluralidade, ao mesmo tempo em que havia, nas palavras de Otávio Paz, uma “ilimitada expansão do eu”.

Dentro desses quesitos, a poesia de Whitman vai tratar, num primeiro momento, de questões relativas à guerra e, principalmente, da formação e concretização de um conceito americano de nação. Essa necessidade de se encontrar o “igual” era relativizada pela profunda modernidade de Whitman que, com seus versos brancos e métrica alucinada, era absolutamente ignorado pela crítica. O poeta, mais do que “maldito”, era um “inaudito”, no sentido de que sua poesia foi esquecida, como um louco ou um desvairado, alguém que poderia “ameaçar a ordem”. Assim, a poesia modernizadora do autor se tornou uma espécie de espectro, uma sombra, um lapso identitário, assim como vê Agamben em relação ao que chama de “contemporâneo”. Tudo isso, em algum momento é louvado e criticado na poesia de Whitman.

Acontece que a poesia dele transborda corpos por todos os lados. O contato do sexo e do desejo, das pulsões e das vontades rasgam a poesia por dentro, retirando-a da noção de projeto. Assim, sua poesia era uma latência, um devir, que demandava uma certa urgência:

 Nunca houve mais início do que agora;
Nem mais juventude ou velhice do que agora;
E nunca haverá mais perfeição do que agora,
Nem mais céu ou inferno do que agora.

Urgência, urgência, urgência,
Sempre a urgência geradora do mundo.

É neste ponto que encontro o nexo com a poesia da Geração Beat Americana: uma ideia de baldear mundos e ganhar experiências, mesmo que elas já sejam improváveis e ainda sejam urgentes. Aí está o legado de Whitman para as gerações posteriores: um projeto sem projetos, uma nacionalidade sem nação, uma pulsão sem pulsos e um corpo que escreve, uma mão que palavreia e uma boca que rumoreja. O que houve? Alucinações ou, como diz o próprio, dobras que se vão entre homem e mulher:

 Desdobrado das dobras

 Desdobrado das dobras da mulher o homem vem desdobrado e sempre há de vir desdobrado,
desdobrado das dobras da mais maravilhosa mulher da terra há de vir o mais maravilhoso homem da terra
(…)
Desdobrado da justiça da mulher toda a justiça é desdobrada,
desdobrada da compaixão da mulher é toda compaixão;
Um homem é grande coisa sobre a terra e através da eternidade, mas cada partícula da grandeza do homem é desdobrado da mulher.

luizLuiz Antonio Ribeiro 28 anos, dramaturgo, letrista, crítico e flamenguista. É bacharel em Teoria do Teatro pela UNIRIO, mestrando em Memória Social na área de poesia brasileira e graduando do curso de Letras/Literaturas. É adepto da leitura, pesquisa, cinema, cerveja e ócio criativo. Desde 2011 é membro do grupo Teatro Voador Não Identificado. Facebook: http://www.facebook.com/ziul.ribeiro Twitter: http://www.twitter.com/ziul

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