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Coluna Literária

[Coluna literária] “Idiopatia” – Sam Byers

Atraída pelo título e pela premissa de ser “um romance sobre amor, narcisismo e animais agonizantes”, como consta na capa, resolvi ler “Idiopatia”, de Sam Byers.

A história poderia muito bem ser o roteiro de um filme de Woody Allen, não só pelos personagens melancólicos e cínicos, como também pelos diálogos onde pormenores se transformam em algo maior, chegando ao ponto de nem os próprios personagens saberem mais do que se trata a discussão. Essa, inclusive, é a especialidade de Katherine, sarcástica, cínica, que de tanto medo de depender de uma outra pessoa para ser feliz, acaba se afastando de todos, e tem a habilidade de transformar qualquer gesto ou comentário inocente numa grande discussão, para que ela se sinta bem ao deixar o outro lado desconfortável.

Não é a toa que Daniel a trocou por Angelica, uma ambientalista militante defensora de grandes causas, como a das vacas que estão morrendo por causa de uma epidemia bovina misteriosa chamada “Idiopatia”. Porém, Daniel não tem lá tanta certeza de que esteja apaixonado por ela e nem de que seja uma pessoa muito boa…

Já Nathan, um amigo em comum do ex-casal, está de volta depois de ter passado um tempo internado em uma clínica psiquiátrica, voltando a viver com os pais e não se sentindo muito à vontade com isso, já que sua mãe se aproveitou de seu problema para lançar o livro “Mãe Coragem: a batalha de uma mulher contra a culpa maternal”.

Como aconselhado na clínica, Nathan resolve procurar seus amigos e eles combinam de se encontrar na casa de Daniel. É aí que a história fica parecendo a peça “Deuses da Carnificina” (que foi adaptada para o cinema por Roman Polanski), pois tentando ser civilizados e agirem como pessoas normais, eles vão perdendo o controle e percebem que talvez a relação entre eles já esteja mais do que desgastada.

Tudo isso é narrado de uma forma descontraída, no entanto, reflexiva:

“A comida e o café chegaram. Eles ignoraram. Na rua, do outro lado da corda que demarcava a área do restaurante, pessoas como eles iam e vinham. Daniel ficou imaginando que tipo de coisa as preocupava conforme caminhavam:os telefonemas que não tinham feito; os telefonemas que não tinham recebido; as minúsculas decepções de um dia normal. Um casal jovem passou uma câmera para um casal idoso e pediu para que tirassem uma foto. A garota usava um moicano azul; a mulher velha tinha o cabelo azulado. Momentaneamente, foi como se o jovem casal estivesse dando a câmera para seus futuros eus. Daniel olhou para Katherine, essa mulher que ele conhecia tão bem. Bem demais, na verdade, para agora conversarem. Ele queria lhe dizer que ela era sortuda, de certa forma, por estar em uma posição em que ainda podia aspirar a mais coisas, em vez de simplesmente recear a perda do que já possuía”.

É uma boa narrativa que, como diz na contracapa, mostra os absurdos dos dias de hoje, através de personagens que ainda hesitam entre a completa descrença e a busca desesperada de ideais.

Marianne Wilbert

Jornalista, pós-graduada em mídias digitais.
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