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Colunas

[Africanidades e direitos humanos] Eu também tenho um sonho

por Sergio Soares

“Eu tenho um sonho: que um dia, nas colinas vermelhas da Geórgia, os filhos dos ex-escravos e os filhos de ex-senhores de escravos possam se sentar jutos à mesa da fraternidade…E u tenho um sonho: que um dia meus quatro filhos vivam num país onde não sejam julgados pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter…”

Inspirado nas palavras do pastor americano Martin Luther King Jr., que em seu discurso em 28 de agosto de 1963 para aproximadamente 250.000 pessoas em Washington defendeu a garantia de direitos civis para os negros, eu, Sergio Soares também tenho um sonho.

Também tenho um sonho que os afrodescendentes radicados em Petrópolis, muitos filhos dos remanescentes dos quilombo do Vargem Grande, na Fazenda Inglesa em 1820, e do quilombo da Tapera em 1852, nas terras doadas por Agostinho Corrêa da Silva Goulão na região do Cuiabá, em Itaipava, entre outras comunidades quilombolas, possam viver em segurança e prosperidade.

Nosso sonho como filhos da luta pela liberdade em Petrópolis, no Brasil e no mundo é pela integração racial desta etnia, que mesmo sendo a maioria da população do Brasil, na soma entre os auto-declarados negros e pardos conforme o Censo 2010 do IBGE, continuamos amargando com altos índices de analfabetismo, evasão escolar, desemprego e o extermínio cruel através de assassinatos.

“As desigualdades raciais, portanto, são aquelas constituídas pelas sociedades, que hierarquizam as diferenciações da cor da pele e dos traços físicos, entre as pessoas, de forma a fazer acreditar que a natureza produz seres humanos superiores e inferiores. Esses processos utilizaram (e continuam a utilizar) armas de fogo para intimidar aquelas pessoas, bem como os homens brancos para escrever a História” (Mulheres Construindo a Igualdade – 2011 , p. 53)

Eu também tenho um sonho, que torna-se realidade diariamente através da união deste nosso povo que supera o preconceito e o racismo, e paulatinamente ocupa novos espaços na sociedade: em 1988 foi criada a Fundação Cultural Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura que promove e incentiva a elaboração de políticas públicas para os afrodescendentes, indígenas e excluidos do desenvolvimento capitalista. No mesmo ano, a Constituição reconheceu as Comunidades Quilombolas, que estão sendo mapeadas e protegidas da especulação imobiliária.

Em 1997 aconteceu o reconhecimento de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares. No dia 21 de março é comemorado o Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, e em 20 de novembro é comemorado o Dia da Consciência Negra.

Em  2010 foi sancionado o Estatuto da Igualdade Racial, estabelecendo uma série de Políticas de Ações Afirmativas, objetivando a inclusão do negro na sociedade: a lei 10.639 /03 estabelece a obrigatoriedade do ensino da História da África e indígena nas escolas públicas e particulares; além das cotas étnico- raciais para ingresso de negros e pardos no serviço público e no ensino superior, e o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, que privilegia estudantes cotistas de instituições federais de ensino.

O sonho de Luther King no passado foi também a aspiração no Brasil de Abdias do Nascimento, ex-senador federal, dramaturgo, poeta, e, como eu, militante do Movimento Negro. Foi também o sonho de Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977), grande escritora negra autora do livro “Quarto de Despejo”, que vendeu mais de 100.000 exemplares.

Sonho  partilhado também por Milton Santos (1926 – 2001), considerado o maior geógrafo brasileiro, que escreveu mais de 40 livros e cerca de 300 artigos científicos, e lecionou nas mais importantes universidades da Europa.

Também tenho um sonho de viver no Brasil com mais justiça social, e de espalhar em todo o mundo os valores do amor cristão. Por esta causa doamos dez anos de nossas vidas em Cabo Verde e Moçambique, na África, de 1996 a 2006.

Atualmente, de volta ao Brasil continuamos sonhando, e para realizar estas aspirações não desisto de estudar e de qualificar-me profissionalmente. Quero dar minha contribuição para que não apenas os afrodescendentes sejam empoderados, mas espalhar o bem para todos os moradores da Terra.

Nestes meus 51 anos de vida ainda sonho em cursar um Mestrado em Educação e Questões Étnico Raciais, quero fazer um Doutorado, escrever e publicar livros, visitar e ajudar o quilombos do Brasil, e ser uma referência como pedagogo, pastor e cidadão afrobrasileiro que marcou positivamente e mudou com sonhos realizados a história das negras, negros e todos no Brasil e no mundo.

Eu também tenho um sonho…

Sergio Soares ([email protected]) é pedagogo formado pela UERJ, pós-Graduado em Educação e Relações Raciais pelo PENESB (Programa de Wducação sobre o Negro na Sociedade Brasileira), na UFF; bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Evangélico Peniel – STEP. Conferencista e militante do Movimento Negro em Petrópolis, também foi missionário em Cabo Verde, na cidade do Mindelo, Ilha de São Vicente de 1996 a 1998, e em Moçambique, com sua esposa Jane e seu filho Kevin por 8 anos. Atualmente cursa Licenciatura em Geografia, na UERJ, e mora em Petrópolis.

Bibliografia:

Mulheres construindo a igualdade: Caderno Étnicoracial / Secretaria da Mulher – Recife – 2011 , p. 53

Petrópolis e os Quilombos – Revista da Cultura e do Turismo – Fundação de Cultura e Turismo de Petrópolis – RJ , 2011 , p. 9.

SHUKER, Nancy. Os grandes líderes – Martin Luther King. Nova Cultural – 1987.

Mais em:

[Africanidades e direitos humanos] Testemunho de um petropolitano na África

2 Comentários

  1. Contundente assunto sobre igualdade racial. Creio que devemos libertar os brasileiros dessa peste que assola nossa nação que é o preconceito. Índios, negros, amarelos, brancos, pobres, medianos e ricos, religiosos ou não. Somos seres que merecemos igualdade de direito à educação, moradia, saúde, oportunidades de trabalho, e o respeito como cidadãos livres, para construirmos um pais gigante, um povo rico e próspero que nós e nossos filhos queremos ver e viver.

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