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Coluna Literária

[Coluna literária] A história por trás de algumas expressões populares

“Não entendo patavina”. “É um elefante branco”. “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. Milhares de expressões foram incorporadas à nossa língua ao longo do tempo, algumas caíram em desuso, mas outras continuam sendo usadas na linguagem popular sem que a gente se dê conta de suas origens. Tentando sanar essa curiosidade, coincidentemente encontrei o  livro “A vida íntima das frases”, do escritor e professor Deonísio da Silva, e selecionei a história por trás de algumas máximas populares para dividir com vocês.

 

A casa da mãe Joana: a expressão que significa um lugar em que se pode fazer de tudo, onde ninguém manda, ou seja, uma espécie de grau zero de poder. A mulher que deu nome à tal casa viveu no século XIV. Chamava-se, obviamente, Joana e era condessa de Provença e rainha de Nápoles.  Em 1347, aos 21 anos, regulamentou os bordéis da cidade de Avignon, onde vivia refugiada. Uma das normas dizia “o lugar terá uma porta por onde todos possam entrar”. Assim, “Casa da Mãe Joana” virou sinônimo de prostíbulo, de lugar onde impera a bagunça.

Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura: utilizada para designar a pertinácia como virtude que vence qualquer dificuldade, por maior que seja, esta frase perde-se no tempo, mas um de seus primeiros registros literários foi feito pelo escritor latino Ovídio (43 a.C. – 18 d.C.), autor de célebres livros como A arte de Amar e Metarmofoses, que escreveu: “A água mole cava a pedra dura”. É tradição das culturas dos países em que a escrita não é muito difundida formar rimas nesse tipo de frase para que sua memorização seja facilitada. Foi o que portugueses e brasileiros fizeram com este provérbio.

 

Chegar de mãos abanando: os primeiros imigrantes deviam trazer as ferramentas indispensáveis ao cultivo da terra, entre as quais eram importantes a foice e o machado, para a derrubada das matas. Dos colonos europeus esperava-se que trouxessem também galinhas, porcos e vacas, bases de uma economia autossustentável. Quem chegasse de mãos abanando não vinha disposto a trabalhar. Manter, pois, as mãos ocupadas era sinal de disposição para o trabalho e ajuda mútua.

É gente de meia-tigela: em Portugal, nos tempos monárquicos, havia vários tipos de nobreza, entre as quais ganhavam destaque a nobreza territorial e a de título. Habitavam os palácios, porém, diversos rapazes que, dados os serviços domésticos que executavam para autoridades, tinham direito a rações, prescritas no Livro da Cozinha del Rei, diligenciada pelo veador, supervisor do mordomo-mor. Tão logo chegaram à corte para trabalhar, moços vindos do interior eram tratados com desprezo pelos que já moravam no palácio. Não tendo direito à moradia, recebiam apenas alimentação e por isso eram tratados com ironia pelos mais antigos como fidalgos de meia-tigela.

 

É um elefante branco: sua origem é um costume do antigo reino de Sião, situado na atual Tailândia, que consistia no gesto do rei de dar um elefante branco aos cortesãos que caíam em desgraça. Sendo um animal segrado, não poderia ser vendido. Matá-lo, então, nem pensar. Não podendo também ser recusado, restava ao infeliz agraciado alimentá-lo, acomodá-lo e ajaezá-lo com luxo, sem nada obter de todos esses cuidados e despesas.

Espírito de porco: no Brasil colonial, os escravos faziam o possível para não serem eles a executar os porcos domésticos, que representavam, ao lado de carnes de aves e de gado, a principal fonte de proteína. Eles acreditavam que o encarregado da tarefa tinha o corpo tomado pelo espírito do porco, que viria assombrá-los. E nos seguintes ao ato de carnear o animal o escravo era olhado com desconfiança pelos companheiros, que viam em qualquer gesto seu o espírito do porco atuando.

 

Maria vai com as outras: a mãe de D. João VI e, portanto, avó de D. Pedro I e bisavó de D. Pedro II, perdeu o juízo e passou a ser conhecida como A Rainha Louca. As cortes a afastaram do trono, legando o poder ao príncipe regente, que depois se tornaria o rei Dom João VI. Confinada a seus aposentos reais, a rainha só saía dali acompanhada por diversas damas de companhia, senão aprontava coisas desatinadas, louca que estava. Quando o povo via o cortejo pelas ruas, sabia que ela não decidira passear, tinha sido levada. Não parecia mais a voluntariosa rainha, agora era apenas uma Maria qualquer, sem vontade nenhuma, que era levada a passear com outras mulheres, muitas das quais chamavam-se Maria também. E a soberana tornou-se apenas uma Maria que vai com as outras, expressão desde então aplicada a quem não tem opinião própria e segue a dos outros.

Não entendo patavina: esta frase se originou em certos descuidos gramaticais do historiador romano Tito Lívio (59 ou 64 a.C. – 17 d.C.), nascido em Pádua, em italiano, Padova, e em latim, Patavinum. Outros escritores latinos, tidos por mais cultos, reprovaram suas expressões, próprias do dialeto da região em que o historiador viveu, o que dificultava o entendimento. Alguns estudiosos dão como explicação o fato de os portugueses terem dificuldade de entender os mercadores e os frades franciscanos patavinos, isto é, originários de Pádua.

Marianne Wilbert

Jornalista, pós-graduada em mídias digitais.
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