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[Na mente de um Strudel] Questão de Motel

por Rafael Studart

Eu tinha 19, a menina 16. Paguei o meu ingresso de cinema e percebi que ela queria que fizesse o mesmo para ela. Não fiz. Timidamente, não o fiz.

A convicção de hoje não existia ainda dentro de mim. Sabia que não fazia sentido pagar, mas me faltava maturidade para impor minhas ideias do jeito certo. Na época a mídia já batia nessa tecla, mas ainda era bem comum encontrar esse tipo de comportamento.

Uma década se passou e fico feliz em ver que há um processo de extinção definitivo disso. Provavelmente por conta do excesso de debate sobre o tema e de quão antiquada era essa situação. Isso não significa, porém, que houve uma mudança interna em todas as pessoas; apenas mascarou-se um dos sintomas de algo muito maior. Um exemplo disso é a questão do motel.

Sexo ainda continua sendo tão tabu que as pessoas não discutem com naturalidade a divisão desse custo. É conta. É gasto. Dá no mesmo.

Sentimos o quão 1950 somos, justamente na hora da notinha do motel. O quanto o “eu divido todas as contas” é só fachada. Todo mundo se satisfez; ou deveria, pelo menos. Não há porque só um pagar, a menos que seja em caráter de exceção; nunca de obrigação.

Desculpas e racionalismos para justificar é o que não faltam: Tenho vergonha de aparecer para o garçom. Como se fosse complicado pegar a máquina do cartão e levá-la para dentro; quebra o clima. Primeiro que não. Segundo que a conta é paga depois do sexo; vai vir na minha fatura. Não, não vai. O nome do estabelecimento é sempre outro. Mas também mostra como o sexo continua sendo encarado; vou ter que me vestir correndo. Não tá nem se esforçando para criar desculpa. Quem disse que dividir conta altera a velocidade da passagem de tempo?

Lembro, certa vez, de algo que uma aluna minha falou: “Eu acordo cedo pensando no que vou vestir, me depilo, faço o cabelo, ponho maquiagem, me arrumo toda e ainda tenho que pagar motel?”.

Não quero nem entrar no mérito do papel que ela se coloca ao fazer uma afirmação dessas. Esse pensamento, vindo de uma pessoa de 20 anos, mostra o quanto ainda devemos falar a respeito desse assunto para podermos encará-lo com naturalidade.

Sexo não é moeda de troca. Quando se pensa dessa forma, abre-se espaço para o controle. E esse jamais deveria ser o caminho de algo tão divertido e puro quanto o sexo, seja num motel, ou numa mesa de bar.

studartRafael Studart é comediante, roteirista e professor universitário de física. Mestre pela COPPE/UFRJ, costuma tentar algo novo com uma certa frequência. Se quiser falar sobre relacionamento e sexo com ele, pode pará-lo na rua. Facebook: http://www.facebook.com/studart7

 

 

 

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